Opinião

Gás Natural: Desafios e Oportunidades para a Região Sudeste

O aumento da oferta de gás natural na região certamente aumentará a competitividade da indústria brasileira, com geração de empregos e contribuições ambientais muito favoráveis

Por Wagner Victer

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O fim do processo eleitoral no país trará certamente grandes debates em relação às posturas que tendem a ser adotadas em consonância com o “Plano Decenal de Expansão de Energia 2031”, estabelecido pela Empresa de Pesquisa Energética – EPE, onde certamente a questão do gás natural merecerá muita atenção, especialmente da região sudeste.

O fato concreto é que a chamada nova Lei Federal do Gás (Lei 14.134/2021) não trouxe ainda os resultados esperados para a sociedade, principalmente para uma série de segmentos econômicos, não só os industriais, mas também no setor de geração. Na verdade, mesmo com a expectativa gerada, o aumento da oferta e a redução dos preços ao consumidor final ainda não se concretizou.

Especialmente no uso do gás para fins veiculares (GNV), em função da alteração tributária de impostos, houve uma redução relevante de sua competitividade. Como não foi feita a diferenciação de “preços de molécula”, atrelando a preços de commodities de derivados internacionais, haverá uma redução no consumo desse gás, trazendo impactos ambientais negativos com o fim da redução de emissão de centenas de milhares de veículos convertidos.

Da mesma forma, será importante definir que estratégias locais devem ser desenvolvidas, não só no âmbito dos produtores de petróleo e gás, mas também das agências reguladoras estaduais e de suas concessionárias distribuidoras, como o caso especificamente do gasoduto da Rota 3. Essa rota deve ter a sua disponibilização no fim de 2023 e ou início de 2024, e merece ter discutidas sub rotas terrestres de distribuição dentro do Estado do Rio de Janeiro a partir do City Gate na futura UPGN de Itaboraí.

Há hoje uma pseudodisputa do gás oriundo de Bacalhau da Equinor entre os estados de São Paulo e Rio de Janeiro. As duas alternativas são a Rota do Gasoduto 4a, entrando por Cubatão/SP, e a Rota 4b, entrando pelo Porto de Itaguaí/RJ. Essa segunda é teoricamente muito mais razoável, pelo seu perfil de criar um Hub de desenvolvimento econômico para a Baixada Fluminense a partir do Gás Natural nacional.

No entanto, essa disputa foi bastante mitigada com os anúncios recentes da Petrobras de potenciais no Campo de Aram, que pode se conectar com uma nova rota no Rio de Janeiro, mas seria mais adequado entrando por São Paulo. Há aqui a possibilidade de evitar esses naturais conflitos políticos em uma lógica não só salomônica, mas também energética.

O próprio gasoduto do campo de Merluza, com plataforma hibernada no litoral Paulista e com capacidade relevante por ser de diâmetro de 16 polegadas, entrará nessa discussão na otimização dessa transferência de produção desse escoamento de gás para o continente. Certamente esse aumento de oferta será a principal maneira de conseguirmos de fato baratear o preço do gás natural para a região sudeste, que é a grande demandante em potencial, em especial para o futuro aumento de termogeração a gás para o subsistema elétrico interligado sudeste/centro-oeste, onde se concentra a maior tendência de crescimento da demanda de carga do país.

Assim, uma solução para resolver a eventual disputa entre as Rotas 4a e 4b, de São Paulo x Rio de Janeiro, poderia ser a construção de um gasoduto que liga Aram a Merluza e então Cubatão, assim atendendo a demanda de gás de São Paulo, enquanto a Rota 4 iria para Itaguaí no Rio de Janeiro.

Para o estado do Rio, outra questão importante é trazer o gás do bloco BM-C-33, em especial de Pão de Açúcar, também da Equinor, para Macaé pelo gasoduto Rota 5, pois aquela região, que outrora era grande produtor e transferidor de gás Natural para o sistema Rio-São Paulo, se tornou um grande Cluster de Termoelétricas e que se integrará a demandas do Porto do Açu em São Joao da Barra, mais ao norte do Estado do Rio de Janeiro.

A definição dessas novas infraestruturas de gasodutos para trazer o gás para a terra será uma questão fundamental e dinâmica. Alguns Estados, como o próprio Rio de Janeiro, desenvolveram um Fundo Soberano a partir de excedentes de royalties e participações e que pode, de alguma forma, trazer um conjunto de apoios e até de incentivos ao consumidor final, com diferenciais que ajudarão muito em absorção, definição de uma demanda firme muito mais consistente.

A aceleração de posturas mais agressivas por concessionárias de distribuição do gás natural é algo que será um dever do Rio de Janeiro, pois ainda existem regiões específicas como Região Serrana, Vale do Paraíba, Baixada Fluminense e Noroeste, onde a oferta de gás ou é inexistente ou de baixa colocação. Também haverá o vencimento do prazo da concessão da distribuidora local, a Naturgy, nos próximos anos, o que talvez possa estar gerando uma indefinição para os investimentos do ramo de distribuição, que podem ser complementados, eventualmente, por aportes estaduais, sem contribuir para a formação da tarifária final pela necessidade de amortização de ativos de concessão.

É necessária também a discussão da criação de políticas de preço especiais para alguns setores onde há uma perspectiva muito grande de crescimento. Seja para alavancar novos projetos de produção de fertilizantes nitrogenados, na petroquímica ou na questão do segmento de siderurgia, ou mesmo para agregar valor ao minério exportado com o padrão Hot Bricket Iron (HBI), esses todos são pontos que devem ser considerados numa articulação entre Estados, segmentos empresariais de mineração e as produtoras de petróleo. Da mesma forma, a oferta de gás inicial pode ser absorvida com o desenvolvimento de plantas de liquefação de gás (GNL), viabilizando exportações em um primeiro momento de parte dos volumes para o mercado europeu, fragilizado na crise entre a Rússia e a Ucrânia.

Esse tema tem potencial e é pertinente, inclusive na redução dos elevados níveis de reinjeção de gás do Pré-Sal da Bacia de Santos, que ainda estão elevados, o que vai merecer uma atenção não somente de estudos de engenharia, mas habilidades de desenvolvimento institucional. Tenho discutido bastante o tema com a Ex-Diretora Geral da ANP, Magda Chambriard, no tocante a essa maior eficácia, em especial para o Estado do Rio de Janeiro, com ensaios muito importantes que temos produzido no âmbito do legislativo estadual fluminense (ALERJ).

O aumento da oferta de gás natural na região sudeste em bases econômicas com maior potencial certamente aumentará a competitividade da indústria brasileira, o que favorece a geração de empregos e tem contribuições ambientais muito favoráveis, inclusive na substituição de combustíveis como carvão, hoje utilizados em diversos segmentos como a Siderurgia, que é forte nesses Estados. Estamos falando da rara situação em que há ganho para a economia e sinergia com políticas de ESG.

 

Wagner Victer é Engenheiro, Administrador, Ex-Secretário de Estado de Energia, Indústria Naval e do Petróleo, e Ex-Conselheiro do CNPE

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