Opinião

Porque taxar petróleo exportado

Exportador de volumes crescentes de óleo, o Brasil não precisa internalizar a volatilidade dos preços no mercado doméstico

Por Adilson de Oliveira

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Os hidrocarbonetos são insumos centrais na vida econômica dos sistemas industriais. Eles garantem não apenas os fluxos de mercadorias e de pessoas, como são essenciais na vida produtiva (geração de energia, petroquímica, fertilizantes etc.). Não é diferente no Brasil. No nosso caso, os hidrocarbonetos ocupam 44,9% da matriz energética. Isso graças ao uso do nosso potencial hidráulico na geração de eletricidade e do etanol no sistema de transporte. Porém, o petróleo exerce papel fundamental no nosso sistema de transporte e como insumo produtivo.

É consensual, na teoria econômica, que a volatilidade do preço do petróleo exerce efeitos danosos para a vida econômica, na expectativa de um cenário de estabilidade que possa garantir rentabilidade adequada ao longo da vida dos projetos. Mitigar essa volatilidade é tarefa reconhecida consensualmente como papel determinante das autoridades econômicas, aponta Ben Bernanke, ex-presidente do Federal Reserve (FED), em artigo intitulado Irreversibility, Uncertiainty and Cyclical Investment, publicado no Journal of Economics em 1983.

A volatilidade elevada do preço do petróleo emergiu como um problema na década de 1970. Naquela época, ela foi contornada com a criação da OPEP, que organizou o suprimento global de petróleo dos sistemas industriais com preços relativamente estáveis. Esse problema ressurgiu de forma brutal após a invasão russa do território da Ucrânia. As sanções aplicadas pelos países da OTAN ao suprimento de petróleo russo, maior exportador de óleo ao lado da Arábia Saudita, desorganizaram o suprimento global desse insumo essencial para os sistemas industriais.

O preço do barril de petróleo explodiu para patamar acima dos U$100 dólares após a invasão e permanece oscilando entre U$75 e U$ 85. Uma solução negociada para a invasão russa pode levar esse preço para US$ 60, enquanto uma escalada na guerra levaria o preço para patamar acima de US$ 100. Essa incerteza tem provocado a redução no ritmo de crescimento econômico das economias industriais. Recentemente, os Emirados Árabes começaram a discutir sua independência da OPEP, agregando mais incertezas ao suprimento de óleo global. É consensual entre os analistas do mercado petrolífero que a estabilidade do preço do petróleo somente será alcançada com uma solução para o conflito na Ucrânia (ver artigos do site Crude Oil Prices). Nessa situação, a volatilidade do preço do petróleo permanecerá elevada no horizonte previsível.

Os países da OCDE têm buscado alternativas para mitigar essa volatilidade. O EUA, produtor de grandes volumes de hidrocarbonetos, porém importador significativo de óleo, têm utilizado suas reservas estratégicas de óleo para complementar o suprimento de seu mercado interno e, dessa forma, mitigar o problema no mercado doméstico. Os países europeus importadores de petróleo e sem reservas estratégicas relevantes têm sinalizado com a aplicação de uma taxação dos lucros das empresas petroleiras, como mecanismo para conter o seu apetite por lucros extraordinários resultantes dos preços elevados do óleo importado. Além disso, eles têm ofertado subsídios para os consumidores como mecanismo para conter os preços dos derivados no mercado doméstico.

No Brasil, a solução dos subsídios já foi usada na década passada com resultados danosos para a economia. No governo passado, a redução dos impostos sobre os derivados foi adotada como solução para o problema, com efeitos desastrosos nas finanças públicas. No entanto, atualmente, o Brasil encontra-se em posição favorável para mitigar a volatilidade do petróleo no mercado internacional. Exportador de volumes crescentes de óleo, o país não precisa internalizar essa volatilidade no mercado doméstico.

A solução proposta pelo governo atual da taxação do petróleo exportado mitiga esse problema, ao orientar a produção doméstica de petróleo para o mercado interno, sem a incidência desse imposto. Nessa condição, o petróleo ofertado no mercado doméstico será precificado a preços inferiores aos do mercado internacional para atender uma demanda segura e cativa das refinarias domésticas, com menores custos de transporte e de internalização dos derivados importados. Na prática, os preços domésticos dos derivados serão menos influenciados pela volatilidade dos preços internacionais.

Os críticos dessa solução apontam para a perda de competitividade do potencial petrolífero doméstico. Basta olhar para os custos de produção do barril de petróleo doméstico no pré-sal (entre US$ 30 e US$ 35, como nos informa a Petrobras) para perceber que o imposto de exportação proposto (9,2%) pouco afetará a lucratividade das petrolíferas, enquanto o preço do barril de petróleo permanecer acima dos US$ 60. Em síntese, esse imposto ajudará a mitigação da volatilidade do petróleo, promovendo a retomada dos investimentos nas mais diversas cadeias produtivas domésticas, sem provocar a perda de atratividade do potencial petrolífero doméstico.

Adilson de Oliveira é professor titular da Cátedra Antônio Dias Leite/Colégio Brasileiro de Altos Estudos da UFRJ.

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