Opinião

Ampliação do Parque de Refino por quê?

Ou amplia-se a capacidade de processamento do petróleo cru e agrega-se valor a ele no Brasil ou estar-se-á desembolsando cifras bilionárias para importar cada vez mais derivados

Por Magda Chambriard

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Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, o Brasil deve fechar 2023 com US$ 93 bilhões em saldo comercial, resultado de uma corrente de comércio de US$ 575 bilhões, com exportações que somaram US$ 334 bilhões e importações de US$ 241 bilhões (Secex/MDIC, outubro de 2023).

Tais números, associados aos resultados da balança comercial de petróleo e derivados, dão a exata noção da importância dessa indústria para o país: de janeiro a novembro de 2023, o resultado da balança comercial de petróleo e derivados atingiu a importante cifra de US$ 24,2 bilhões (26% do resultado nacional).

É pacífico o entendimento de que esse grandioso resultado foi devido ao esforço empreendido para a aceleração do desenvolvimento do Pré-Sal ou, mais especificamente, para a aceleração do desenvolvimento das gigantes descobertas nacionais (Tupi, Búzios, Mero, Sapinhoá etc). Mas é importante que se diga que, à época desses empreendimentos, se pretendia mais. Além do desenvolvimento do Pré-Sal, também se pretendia mais refino para agregar mais valor ao óleo nacional e atender as demandas do Nordeste, principalmente.

Nesse sentido, vale analisar os números acima. De janeiro a novembro de 2023, as exportações líquidas de petróleo cru somaram US$ 30,2 bilhões. Exportou-se em média 1.474.890 bopd[1] de petróleo cru, auferindo-se uma receita de US$ 38,8 bilhões, e importou-se em média 302.914 bopd, que representaram um desembolso de US$ 8,6 bilhões (as importações são necessárias para majorar a eficiência do parque de refino nacional).

No entanto, como o país não é autossuficiente em derivados, parte das receitas geradas pela exportação líquida de cru foram consumidas com importações de derivados, dentre eles o diesel, além da nafta, gasolina etc. No total, foram importados em média 583.300 bpd de derivados, gerando um desembolso de US$ 17,1 bilhões. Em paralelo, o refino nacional gerou um excedente a ser exportado, principalmente de óleo combustível, de 363.238 bpd. Essas exportações geraram uma receita de US$ 11,1 bilhões, auxiliando a mitigar as despesas de importação. Com elas foi possível se chegar a uma importação líquida de derivados de US$ 6 bilhões, em 2023[2] (Figura 1).

Fonte:ANP

 

Figura 1 – Comércio líquido de petróleo cru e derivados

 

O elevado montante despendido com importações de derivados fez que, à época das descobertas do Pré-Sal, se pretendesse ampliar a capacidade de refino do país, para agregar valor ao cru brasileiro e mitigar os grandes desembolsos decorrentes da importação de derivados. Por isso, não foi surpresa quando as importações de derivados atingiram a cifra de US$ 17,1 bilhões, de janeiro a novembro de 2023, e as importações de diesel chegaram a US$ 8,5 bilhões, no mesmo período.  Em 2023, para além do diesel, cuja importação já representa 24% do consumo nacional, gasolina e nafta também se configuraram como importações relevantes (Figura 2).

Fonte: ANP

 

Figura 2 – Desembolso com importações de derivados

 

A preocupação com a evolução das importações de derivados, principalmente diesel, é antiga na ANP. Em 2016 a agência alertava para a crescente dependência dessas importações e seu impacto na balança comercial e na logística portuária. Em 2022, se desembolsou US$ 25,9 bilhões com importação de derivados, volume ainda maior que os US$ 17,1 bilhões reportados para o período de janeiro a novembro de 2023. A redução do dispêndio, em 2023, se deveu ao esforço da Petrobras em prol de uma melhor eficiência de refino e, ao mesmo tempo, à queda de preços no mercado internacional.

Em 2023, considerando exportações e importações, as movimentações de óleo cru atingiram 2,7 milhões de bpd nos portos do país, montante nada fácil de movimentar.

Importante destacar que, mesmo com as dificuldades logísticas inerentes a tão grandiosa movimentação de líquidos, e com os elevados montantes de recursos despendidos, sem expansão do refino a tendência é que cresça a dependência do derivado importado, mormente diesel para abastecimento do mercado nordestino. O Brasil é um país continental, carente de cada vez mais energia para seu crescimento. Ou amplia-se a capacidade de processamento do petróleo cru e agrega-se valor a ele no Brasil (diga-se de passagem, que foi assim que a Petrobras cresceu) ou estar-se-á desembolsando cifras bilionárias para importar cada vez mais derivados, apesar da transição energética ser uma realidade no Brasil há décadas (hidráulica, etanol, biodiesel, eólica etc).

Olhando o futuro, e considerando que as variações das vendas de diesel pelas distribuidoras guardam boa correlação com o crescimento do PIB real do país (Figura 3), e que o Brasil poderá crescer, até 2030, no ritmo de seu crescimento médio entre 2000 e 2021 (2,2%), pode-se especular um crescimento das vendas desse derivado de cerca de 200.000 bpd, até 2030 (Figura 4), montante similar ao acenado pela Petrobras para ampliação de sua capacidade de processamento de petróleo, em seu Plano de Negócios 2024-2028. Também se pode especular um possível crescimento da demanda por derivados importados, da ordem de até 400.000 barris por dia entre 2024 e 2030, caso não haja expansão de capacidade de refino.

Fonte: ANP e IBGE[3]

Figura 3 – Variação do PIB real e das vendas de diesel pelas distribuidoras

 

Fonte: ANP

 

Figura 4 – Vendas de diesel pelos distribuidores – Histórico e Previsão

 

É nesse contexto que se vê com bons olhos o compromisso Petrobras de expansão do Parque de Refino Nacional, contemplando expansão de capacidade no Nordeste, conforme expresso em seu planejamento estratégico 2024-2028. Afinal, embora o Brasil seja uma das TOP 10 economias do mundo, US$ 17,1 bilhões em importações anuais de derivados não lhe são desprezíveis, assim como também não o são os impactos de crescentes demandas de combustíveis líquidos e de crescentes volumes a pressionar a logística de distribuição, até 2030. Em uma avaliação simplificada, que ressalta a ordem de grandeza desses impactos, estima-se que, aos atuais preços médios de importação de derivados, um acréscimo de 400.000 barris por dia nas importações representaria saltar de uma importação de US$ 17,1 bilhões para uma importação total de derivados de cerca de US$ 29 bilhões, montante nada desprezível para o país (mormente quando se exalta a contribuição de US$ 25 bilhões da balança comercial de petróleo e derivados).

Também merece destaque a intenção da empresa de ampliar o fornecimento de diesel S10 em cerca de 290 mil barris por dia até 2028, volume um pouco superior ao do possível crescimento de demanda de diesel até 2030, mas ainda aquém do necessário em termos de mitigação de emissões.

Ao ressaltar a positividade da Petrobras em termos de garantia de fornecimento de combustíveis, pretende-se reconhecer o empenho da empresa em prol da garantia do abastecimento nacional de combustíveis e da agregação de valor às commodities produzidas em território nacional. Espera-se, no entanto, que esse empenho seja contínuo, para que os investimentos acenados pela empresa, assim como seus resultados, ocorram de forma célere e tempestiva, trazendo resultados reais em termos da geração de emprego e renda no país.

 

[1] Barris de óleo por dia

[2] Período de janeiro a novembro.

[3] PIB de 2023 considerado a partir de estimativa da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia, em 19-09-2023.

 

 

Magda Chambriard, engenheira, mestre em Engenharia Química e Civil, é diretora da Assessoria Fiscal da Assembléia Legislativa do RJ (Alerj) e sócia da Chambriard Engenharia e Energia. Escreve na Brasil Energia a cada três meses.

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