e-revista Brasil Energia 483

Brasil Energia, nº 483, 30 de outubro de 2023 33 Wagner Victer é engenheiro, administrador, ex-secretário de Estado de Energia, Indústria Naval e do Petróleo, e ex-conselheiro do CNPE. Escreve mensalmente na Brasil Energia. Wagner Victer Foi aprovado recentemente pela Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado Federal o projeto de Lei nº 412/2022, que regulamenta o mercado de carbono no Brasil. Isso traz à tona uma discussão imprescindível sobre a urgência em adotarmos medidas assertivas, porém economicamente lógicas, de combate às mudanças climáticas, mesmo diante da baixíssima contribuição do país no cenário internacional das emissões. O Projeto que estamos debatendo no Brasil foi basicamente inspirado no modelo cap-and- -trade, já em vigor na União Europeia (EU ETS), na Califórnia, e em outros lugares do mundo, e se propõe a estabelecer um teto para as emissões de gases de efeito estufa, permitindo que as empresas abaixo desse limite comercializem seus créditos para aquelas empresas que não conseguirem diminuir suas emissões. Para isso, seria implantado o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), que através de um órgão público gestor definiria tetos de emissão diferentes para cada segmento, em especial da indústria, proporcionais às médias e metas nacionais. Mas o que podemos aprender com as políticas de crédito de carbono adotadas no mundo, e de que forma podemos adaptar tais lições ao contexto brasileiro? A principal referência nesse tema é o Sistema de Comércio de Emissões da União Europeia (EU ETS), maior sistema cap-and-trade do mundo, iniciado em 2005. Ele cobre cerca de 45% das emissões de gases de efeito estufa da UE e engloba mais de 11 mil instalações industriais e de geração de energia. Desde sua implementação, o EU ETS contribuiu significativamente para a redução das emissões na Europa. Segundo dados da Comissão Europeia, entre 2005 e 2020 as emissões das instalações participantes diminuíram em torno de 35%. Este é um número relevante, principalmente quando consideramos o crescimento econômico do bloco nesse período. Contudo, esse sucesso na redução das emissões também não veio sem problemas. O EU ETS começou com uma superalocação de licenças gratuitas, em grande parte devido à generosidade inicial na distribuição, por conta de lobby industrial. Este excesso de permissões no mercado diminuiu o incentivo para as empresas reduzirem suas emissões, uma vez que havia uma abundância de licenças disponíveis a preços muito baixos (abaixo de €3 por tonelada de CO2). Esse cenário não só enfraqueceu a integridade e a eficácia do sistema, mas também levou a críticas quanto à sua capacidade de produzir mudanças reais na prática industrial. Em resposta a esta situação, a UE implementou uma série de reformas ao longo dos anos. Essas reformas buscaram reduzir o número de licenças em circulação, principalmente através da introdução dos chamados leilões. Os leilões tornaram-se uma ferramenta chave para estabelecer um preço real e significativo para a captura do carbono. Com menos licenças disponíveis gratuitamente, as empresas tiveram mais incentivo para inovar e reduzir emissões. Esse movimento para a alocação baseada em leilões levou a um aumento sustentado no preço do carbono, refletindo um equilíbrio mais realista entre oferta e demanda. Atualmente, a tonelada de CO2 está a €85, o que definitivamente seria um preço proibitivo se aplicado à indústria brasileira. Além disso, aconteceu na Europa a “fuga de carbono”, que representou e ainda representa um desafio real para qualquer sistema Créditos de carbono na União Europeia: lições e reflexões para o Brasil

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