Opinião

Nova lei do gás aprovada, e agora?

Apesar das expectativas de resultados regulatórios no curto prazo, existem empecilhos que podem postergar efeitos contundentes da lei do gás para 2023

Por Adrianno Lorenzon

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Muita gente tem se perguntado: o que aconteceu com a Nova Lei do Gás? Avisaram que o novo marco legal iria trazer melhores preços e, até agora, só ouvimos falar de um aumento de quase 40% anunciado pela Petrobras. Analisaremos o que podemos esperar para os próximos meses, mesmo sabendo que não existe solução mágica para um mercado tão complexo.

Depois de longos anos de discussão, a lei nº 14.134/2021, chamada de Nova Lei do Gás, revogou a lei 11.909/2009 e trouxe um conjunto de reformas para tornar real a tão sonhada abertura do mercado. A lei aprovada tem potencial para trazer benefícios para a sociedade brasileira e não para atender segmentos específicos ou a um determinado grupo econômico. Há perspectivas reais de que provoque maior investimento, geração de emprego e de renda, redução do custo final do gás natural, temas intensamente debatidos durante a tramitação da lei. Mas, e agora? Quando sentiremos esses benefícios? 

As experiências internacionais evidenciam que a liberalização do mercado de gás propicia os impactos propagandeados, mas também indicam que o caminho é longo para chegar lá. 

No curtíssimo prazo, a lei tem o efeito de dar confiança aos agentes da cadeia para tomarem decisões. Logo após sua aprovação, foram anunciados investimentos bilionários para trazer o gás do pré-sal (campo BM-C-33) para a costa, a fim de ser processado e comercializado. Para sair do papel, projetos como este disparam uma cadeia de investimentos, mas o gás, em si, ainda demorará alguns anos até ser produzido e vendido.

Outro efeito da lei será dar mais segurança a algumas diretrizes de abertura que já vinham sendo implementadas, fruto do acordo da Petrobras com o CADE, tais como: acesso às UPGNs e escoamento, adaptação dos contratos de transporte para liberação de capacidade e independência dos transportadores. Todas essas medidas são importantes e devem ter avanço no curto prazo.

Segundo a ANP, até o fim deste ano a agência deve finalizar a elaboração do Código Comum de Acesso às infraestruturas essenciais, possibilitando o acesso de terceiros também a terminais de regaseificação. Trata-se de medida essencial para possibilitar a entrada de novos comercializadores no mercado, que podem balizar o preço do gás brasileiro com oportunidades no mercado internacional de GNL.

Além disso, o transporte, principal nó da cadeia do gás, deve ser desatado até o fim deste ano. Informações da ANP e dos transportadores apontam para oferta de capacidade firme nos três sistemas de transporte da malha integrada (TBG, NTS e TAG) a partir de 2022. Assim, outros agentes poderão utilizar os gasodutos de transporte, possibilitando a diversificação na oferta.

Apesar de haver expectativas de resultados regulatórios no curto prazo, a começar ainda este ano, há empecilhos que podem postergar efeitos contundentes da lei do gás para 2023. Os avanços supracitados só devem ser efetivados no fim do ano. Até lá, distribuidoras de gás e potenciais consumidores livres já estarão com seus contratos de gás para 2022 fechados (possivelmente com o mesmo supridor), limitando a contratação direta pelos consumidores com comercializadores alternativos. 

Está pendente, ainda, outra ferramenta para viabilizar contratos fora do guarda-chuva da Petrobras: a previsão explícita de que a petroleira proverá serviços de flexibilidade para fornecimento de gás. Esta diretriz está na resolução 16/2019 do CNPE e permite que outros supridores e consumidores consigam ajustar seus portfólios para assegurar os volumes contratados, bem como precificar esses ajustes. Falei sobre esse assunto neste artigo.

Existem condições para que, marginalmente, sintamos os efeitos da nova lei do gás já a partir de 2022. É possível que a partir do ano que vem surjam transações fora do modelo Petrobras x distribuidoras, que é a centelha para iniciar a competição e a redução dos preços. Para que isso aconteça, a ANP deve acelerar as medidas que estão em curso; agências reguladoras estaduais, distribuidoras e Petrobras devem considerar a flexibilização dos contratos e regras para permitir a migração de consumidores ao mercado livre. 

O caminho é longo, mas temos condições de encurtar a transição e já começar a usufruir da abertura de mercado em 2022. Mas para isso, o comprometimento dos atores do setor é essencial.

Adrianno Lorenzon é gerente de Gás Natural da Associação dos Grandes Consumidores de Energia e de Consumidores Livres (ABRACE)

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