Opinião

Fora da rota

Por Eugenio

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No livro Confissões de um Assassino Econômico, publicado em 2004, o autor John Perkins narra sua experiência como agente recrutado pela Agência Nacional de Segurança − NSA dos EUA, para atuar na defesa de interesses do governo e de corporações norte-americanas. Os instrumentos utilizados por ele eram a corrupção, o suborno, o aliciamento e a cooptação de empresários, jornalistas, ativistas, líderes políticos e membros dos governos de países pobres e em desenvolvimento. Embora contestado pelo Departamento de Estado dos EUA, Perkins faz relatos convincentes sobre a sua participação em muitos fatos de conhecimento público, em especial naqueles que envolvem a indústria do petróleo.

Em outra vertente deste mesmo tema, o Departamento de Justiça e o FBI, dos EUA, a Agência Nacional Anticrime, da Grã Bretanha, e a Polícia Federal da Austrália iniciaram, em 2016, uma investigação conjunta sobre as revelações feitas pelo The Huffington Post, dos EUA, e pela rede Fairfax Media, da Australia, acerca das atividades da empresa Unaoil, no que seria o maior escândalo de corrupção em negócios de petróleo, em todo o mundo. As bases para a investigação constam da publicação The Bribery Factory (A fábrica de propinas) e estão disponíveis na internet. Foram revelados os esquemas de corrupção utilizados em países ricos em petróleo do Oriente Médio, África e Ásia e relacionadas as empresas que participaram das fraudes, todas elas multinacionais do setor e velhas conhecidas nossas. O pagamento de propinas a agentes do governo e a executivos locais garantia a contratação de serviços de construção e de fornecimento de materiais e equipamentos. As investigações prosseguem e os responsáveis vêm sendo punidos à medida que são comprovados os crimes cometidos.

A corrupção, portanto, prospera em todo o planeta, combinando os interesses das grandes corporações com a falta de princípios éticos dos agentes envolvidos. As brechas existentes nos sistemas de controle favorecem as práticas criminosas. Empresas e governos que buscam inibir a corrupção geralmente o fazem por meio da estruturação de sistemas de governança e compliance mais eficazes. Prevalece a crença de que as perdas evitadas compensam os recursos aplicados em controles cada vez mais rigorosos.

Empresas e governos que buscam inibir a corrupção geralmente o fazem por meio da estruturação de sistemas de governança e compliance mais eficazes. Prevalece a crença de que as perdas evitadas compensam os recursos aplicados em controles cada vez mais rigorosos

Seguindo este paradigma, a diretoria da Petrobras promoveu as mudanças necessárias em seus processos de governança e compliance e estabeleceu um controle mais rígido das atividades de contratação de bens e serviços. Esquivou-se, no entanto, a reavaliar a política de contratação do tipo Engineering, Procurement and Construction  (EPC) que, desde 2005, vem sendo adotada na implantação de novas unidades industriais. Além de facilitar a atuação nociva de agentes externos, os contratos do tipo EPC podem causar prejuízos ainda maiores que os da corrupção.

Não há nenhuma evidência de que as obras construídas de acordo com essa política tenham se tornado menos dispendiosas, de melhor qualidade ou de menor prazo. Ao contrário, foram observados acréscimos de custo e de prazo da ordem de 30% a 40%, em média. Além disso, o uso continuado do modelo EPC promoveu a concentração de contratos em um número limitado de empreiteiras, sujeitando a Petrobras às manobras de um cartel que se formou, exatamente, pela falta de competitividade nas licitações. Por todos esses motivos, surpreende o fato de que o projeto denominado Rota 3 esteja sendo contratado utilizando o modelo EPC. Destinado a completar a infraestrutura de escoamento de gás natural do polo pré-sal da Bacia de Santos, o Rota 3 é composto de unidades industriais  e de transporte de gás, com tecnologias amplamente dominadas pela Petrobras. Não há, portanto, nenhuma justificativa para que o gerenciamento do projeto seja transferido a terceiros, provavelmente a empresas estrangeiras.

A contratação por EPC continuará agregando custos ao Capex da Petrobras, ainda que não ocorram desvios, fraudes e atos de corrupção por parte de seus empregados. A atual política de contratação é um desvio de rota que requer correção imediata.

Eugenio Miguel Mancini Scheleder trabalhou na Petrobras. Também ocupou cargos de direção nos ministérios de Minas e Energia e do Planejamento, de 1991 a 2005. Atualmente, exerce a função de Mediador Extrajudicial, capacitado pela Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem – CCMA/RJ

 

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