Opinião

A Petrobras, o pré-sal e as independentes do setor de petróleo

O Brasil vem dando uma lição de coerência e ressaltando a segurança jurídica e a oportunidade de se investir no país. No entanto, há que se reconhecer que esse caminho ainda não está de todo trilhado

Por Magda Chambriard

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A frase que a Petrobras escolheu para apresentar seu Plano de Negócios 2022-2026, anunciando investimentos de US$ 68 bilhões no quinquênio, não poderia ser mais feliz: “As escolhas que fazemos hoje vão garantir nosso futuro.”

Até porque, em se tratando de empresa operadora de 93% da produção de óleo e gás do Brasil, o “nosso futuro” transcende os limites da companhia, atingindo as fronteiras do Brasil.

Nesse contexto, há que se louvar a continuada opção governamental pelo desenvolvimento do pré-sal, ainda que em ritmo muito mais lento do que o inicialmente pretendido (o Plano de Negócios 2013-2017 anunciava investimentos de US$ 237 bilhões) e pelo desinvestimento de ativos economicamente marginais para a estatal.

Os ganhos dessas empreitadas saltam aos olhos: em 10 anos (2011 a 2021), o pré-sal contribuiu para que a produção do Brasil saltasse de 2,5 milhões de barris de óleo equivalente por dia (MM boepd) para 3,8 MM boepd. O campo de Tupi, maior produtor do pré-sal, produziu em novembro de 2021 nada menos do que 1,132 MM boepd. O pré-sal, em si, já responde por 73% da produção do país.

É claro que a gestão de empreendimentos de tal monta levou à necessidade de maior atenção a oportunidades gigantes e ao desinvestimento de ativos maduros, com o consequente e continuado esforço governamental em prol da inserção das empresas independentes.

No total, conta-se hoje com mais de 30 operadoras de pequeno e médio porte. Até pouco tempo seria inimaginável pensar que algumas delas seriam capazes de ofertar à Petrobras mais de US$ 1 bilhão pela compra de um conjunto de campos em terra, em ano de pandemia e preços de petróleo depreciados. Seria igualmente inimaginável contar com empresas genuinamente brasileiras, além da Petrobras, operando no mar, inclusive em águas profundas.

Sem pretender ser extensiva, é importante ressaltar alguns resultados dessa jornada: (i) a PetroReconcavo, pioneira no segmento das independentes, cresceu a ponto de hoje operar 58 concessões, em duas bacias sedimentares diferentes, (ii) a Eneva, operadora de campos de gás obtidos a partir de contratos licitados pela ANP, se tornou em barris de óleo equivalente, a maior produtora de petróleo e gás em terra, depois da Petrobras (iii) a Petrorio, operadora de ativos marítimos, inovou introduzindo o conceito de produção em clusters, aproveitando-se de sinergias operacionais possíveis, e hoje responde pela produção de 35.000 boepd, sendo a primeira independente a adquirir ativos maduros das gigantes do setor (as primeiras iniciativas foram a aquisição do campo de Polvo, da BP, e a parcela da Chevron no campo de Frade).

Em apertada síntese, em que pese as diferenças de velocidade do enfrentamento das questões afetas ao setor petróleo por parte dos diferentes gestores públicos, o país vem dando uma lição de coerência e ressaltando a segurança jurídica e a oportunidade de se investir no Brasil. No entanto, há que se reconhecer que esse caminho ainda não está de todo trilhado, e que o país tem uma grande responsabilidade com as independentes por ele atraídas: o de continuar suportando o seu crescimento.

A mudança de cenário de uma operadora predominante para um com uma predominante operando em parceria com umas poucas gigantes, em paralelo com dezenas de pequenas e médias independentes, demanda um sério ajuste não apenas regulatório, mas também do ritmo de implementação desses ajustes.

A redução dos royalties para as áreas inativas com acumulações marginais, para a produção incremental e para as pequenas empresas, apesar de absolutamente importantes, não são suficientes para cobrir todas as necessidades do setor. Ao longo do tempo, a extensão da vida produtiva dos campos vai necessitar cada vez mais atenção. Exemplo disso é a necessidade de se aproveitar áreas exploratórias de baixo risco para ampliar o portfólio dessas empresas.
De imediato, aguardam-se os estudos do Promar, a resposta da ANP em prol do incentivo à produção incremental para os campos marítimos e a possibilidade de essa regulação viabilizar o aproveitamento de diversas oportunidades exploratórias já avaliadas e até então consideradas antieconômicas.

Muito provavelmente ter-se-á que discutir também, estado a estado (e no Confaz), o ICMS incidente sobre a venda do óleo produzido no país para as refinarias brasileiras. Afinal, não faz sentido ser mais viável exportar óleo brasileiro para a Ásia do que vendê-lo para a recém-privatizada refinaria de Mataripe (a antiga RLAM), por exemplo.

E para os iniciados, é importante lembrar que não há sistema petrolífero ativo sem uma questão importantíssima: o sincronismo. Colocando o mesmo contexto em termos de gestão de negócios, é imprescindível que o suporte às independentes seja tempestivo, para que possam crescer a partir do aproveitamento de oportunidades exploratórias e de produção disponíveis no mercado.

Se assim for, estar-se-á gerando trabalho e renda com ativos que, de outra forma, seriam desperdiçados.

No mais, espera-se que o Estado brasileiro, ao lidar continuadamente com o pré-sal, não esmoreça em relação aos independentes, pois eles certamente gerarão importante quantidade de postos de trabalho, que o país não está em condições de desperdiçar.

Magda Chambriard é pesquisadora da FGV Energia

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